Demissões em massa no Itaú: o estopim da polêmica
Nos últimos dias, o Itaú anunciou uma onda de demissões que impactou milhares de trabalhadores em todo o país. A justificativa oficial apresentada pelo banco foi a suposta baixa produtividade no trabalho remoto. O tema rapidamente ganhou espaço nos noticiários e nas redes sociais, tanto pela dimensão do corte quanto pela explicação escolhida pela instituição.
Essa justificativa, no entanto, soa frágil e pouco convincente. O Itaú alegou usar métricas de monitoramento de atividade nos computadores dos funcionários, mas nunca detalhou quais critérios foram adotados, nem como esses parâmetros sustentariam algo tão drástico quanto a dispensa em massa. Para muitos, isso pareceu mais uma narrativa conveniente do que um motivo real.
Por que o caso ganhou tanta repercussão
O layoff do Itaú não é um caso isolado. Bancos e big techs vêm retomando a discussão sobre trabalho presencial e híbrido, muitas vezes com a mesma justificativa: queda na produtividade do home office. A decisão do Itaú, no entanto, ganhou repercussão justamente por ressuscitar esse debate em pleno 2025, quando pesquisas e líderes de mercado apontam em outra direção.
A justificativa oficial do banco
A posição do banco foi clara: os cortes se devem à “baixa produtividade” no home office, medida por softwares de monitoramento.
“Os indicadores de produtividade demonstraram queda no desempenho dos colaboradores em regime remoto.”
O problema é que o Itaú não especificou quais métricas foram analisadas nem apresentou dados comparativos sólidos. Na prática, medir movimentação de mouse ou tempo logado em sistemas não equivale a avaliar resultados de trabalho.
Essa falta de transparência alimentou ainda mais a percepção de que a justificativa tinha menos a ver com performance real e mais com uma estratégia de discurso.
O que contam os funcionários demitidos
A narrativa de improdutividade contrasta com os relatos de ex-funcionários. Em entrevistas e postagens no LinkedIn, muitos afirmam que recebiam feedbacks positivos, bônus de performance e até prêmios de reconhecimento pouco antes de serem desligados. De repente, foram rotulados publicamente como “improdutivos”.
Um depoimento publicado pelo G1 ilustra a contradição:
“Trabalhei sete dias seguidos e até de madrugada. E agora dizem que fui desligado por baixa produtividade.”
Além da humilhação, há o peso humano: carreiras interrompidas, famílias impactadas e profissionais expostos a um estigma injusto diante do mercado.
Outro ponto relevante é que em corporações desse porte muitas vezes as estratégias definidas pelo alto escalão se sobrepõem ao contexto real dos times. Isso significa que, ainda que gestores imediatos avaliem positivamente seus colaboradores, tais reconhecimentos pouco importam quando a direção decide executar cortes em massa. Essa distância entre discurso e prática torna ainda mais evidente a fragilidade da justificativa de improdutividade.
E pelos relatos, até os próprios gestores diretos foram surpreendidos com a decisão. Muitos não tiveram voz no processo nem conseguiram explicar de forma convincente aos times o motivo dos desligamentos. Ou seja: nem as avaliações humanas tiveram peso frente às métricas automatizadas e às ordens vindas de cima.
Especialistas, pesquisas e agora… a Justiça
O episódio também trouxe à tona o debate jurídico e acadêmico sobre monitoramento no trabalho remoto. Especialistas em direito trabalhista destacaram que o monitoramento excessivo pode configurar assédio e que a lei brasileira exige proporcionalidade e transparência no uso dessas ferramentas.
Pesquisas recentes reforçam a fragilidade da justificativa do Itaú. Estudos como o de Stanford (Nicholas Bloom, 2024), por exemplo, mostraram que modelos híbridos mantêm produtividade e aumentam retenção. Outro levantamento, o “Índice de Confiança Robert Half” (ICRH), revelou que 77% dos trabalhadores preferem ter ao menos parte do trabalho de forma remota, e empresas com regimes flexíveis registram maior satisfação e crescimento.
Ou seja: não faltam números que desmentem a ideia de que o remoto é improdutivo.
E agora a questão foi parar também nos tribunais. O Sindicato dos Bancários anunciou que ingressará com uma ação judicial contra o Itaú, questionando a legalidade das demissões em massa e exigindo transparência nos critérios utilizados para os cortes. O sindicato argumenta que a justificativa de “baixa produtividade” é insuficiente e que o desligamento coletivo, feito dessa forma, fere princípios legais e trabalhistas.
Esse movimento mostra que o caso extrapola o debate sobre produtividade e abre também uma frente jurídica importante, que pode trazer desdobramentos para todo o setor bancário.
Narrativa de mercado ou problema real?
Há quem aponte coincidências entre o posicionamento do Itaú e interesses de mercado. O banco tem ligação com a Kinea, uma das maiores gestoras de fundos imobiliários do país, que investem em prédios corporativos. Quanto mais os escritórios esvaziam, maior o desafio para esse tipo de ativo.
Não é possível afirmar que esse fator tenha motivado as demissões, mas o contexto ajuda a entender por que a narrativa do home office “improdutivo” pode ter sido conveniente.
Além disso, como empresa de capital aberto, o Itaú tem incentivos para reduzir custos de curto prazo e impactar positivamente suas ações na bolsa — uma prática comum em grandes corporações.
O contraste com o iFood
O contraste fica evidente quando olhamos para o posicionamento de outros líderes. O CEO do iFood, por exemplo, afirmou recentemente que não existe evidência de que o home office prejudique a produtividade e que a empresa nunca cresceu tanto como nos últimos três anos — justamente em regime remoto.
“Cadê o número que mostra que o presencial é mais produtivo?” — Diego Barreto, CEO do iFood
Enquanto o Itaú atribui suas demissões a suposta improdutividade, o iFood credita parte do seu crescimento à flexibilidade. São visões opostas sobre o mesmo modelo de trabalho.
Minha leitura do caso
Ao analisar o caso, fica claro que a justificativa de baixa produtividade não se sustenta. O problema não está no home office em si, mas na forma como as empresas estruturam seus processos e culturas. Quando falta clareza em métricas, rituais de conexão e confiança, o remoto vira bode expiatório.
Na prática, o layoff do Itaú parece muito mais uma decisão estratégica de mercado do que um problema genuíno de produtividade.
Produtividade de verdade: o que deveria estar em debate
O caso do Itaú mostra que, quando o discurso não bate com a prática, o home office vira bode expiatório conveniente. Mas se o mercado realmente quiser debater produtividade, há caminhos mais sérios do que culpar o trabalho remoto. Entre eles:
- Métricas sólidas de resultados: medir entregas, não movimento de mouse.
- Transparência nas decisões: critérios claros de avaliação e desligamento.
- Cultura de confiança: autonomia com responsabilidade.
- Processos bem desenhados: onboarding estruturado, rituais de conexão e comunicação assíncrona.
E você, o que pensa?
O caso do Itaú expõe como a narrativa corporativa pode distorcer realidades para justificar decisões impopulares. Layoffs fazem parte da dinâmica de grandes empresas, mas responsabilizar o home office sem apresentar dados sólidos é jogar contra um modelo que transformou carreiras, famílias e mercados.
E você? Acredita que a baixa produtividade justifica um layoff em massa ou foi apenas retórica de mercado?